Lua Cheia em Peixes – Neste Vale de Lágrimas chamado Vida
Chegamos à culminação de mais um ciclo com a Lua Cheia em Peixes de hoje (08 de setembro de 2014, 22h38min, Brasília). O Sol está em Virgem e a Lua em Peixes, a 16°19’ dos respectivos signos. Uma Lua Cheia que se dá com sensibilidade extrema, trazendo uma consciência aguda da dor de nossas feridas mais profundas, para as quais não encontramos alívio. Uma Lua Cheia que mais parece uma Via Dolorosa de muito choro, tristeza e desamparo.
A Lua Cheia abre uma semana um pouco complicada de administrar, com vários aspectos tensos acontecendo e os aspectos harmoniosos se mostrando de menos peso. Para começar, a Lua passou o dia imersa nos braços de Netuno, seu senhorio, os dois em oposição a Vênus em Virgem e ela chega à fase cheia pelo abraço doloroso de Quíron, com quem faz conjunção, estando também em trígono com Saturno em Escorpião. O Sol, aliado a Saturno, faz um Yod que tem Urano em Áries de foco. Júpiter, o outro regente da Lua Pisciana está em conflito aberto com Saturno em Escorpião, além de também estar em quincunce com Plutão – ou seja, uma situação bem desagradável. Júpiter está ainda em trígono com Urano em Áries e recebe um sextil de Mercúrio em Libra. Por falar em Mercúrio, é ele o regente do Sol Virginiano, e enfrenta grandes batalhas nesta semana. Está em oposição a Urano em Áries e em quadratura a Plutão, formando uma Cruz T Cardinal. Vale ainda mencionar que Lua e Quíron fazem um Grande Trígono em Água com as Deusas (asteróides) Juno e Vesta – configuração que talvez ofereça algum suporte e conforto neste Vale de Lágrimas que a Lua atravessa. Mercúrio é o único planeta em Ar, o que lhe traz grande responsabilidade e peso para lidar com toda essa Água sem se afogar.
Passamos o dia como em estado de sonho, preferiríamos nos demorar na cama, fugir da rotina diária e massacrante, porque o corpo pesa, o sentimento pesa mais ainda, denso feito chumbo e gostaríamos de permanecer ilhados em nossa introspecção – algo contraditório para uma Lua Cheia. Sonhamos e devaneamos, querendo perder-nos em mundos e visões outros que nada têm de palpável ou inteligível. Seja no sono ou na vigília, tais sonhos são ricos, imaginativos, de cores e imagens caleidoscópicas, como se estivéssemos sob efeito de alguma droga, e acabam por nos deixar à deriva no meio do Grande Mar de nossas fantasias.
Entretanto, a conjunção com Quíron vem nos arrancar de forma dura e cruel de nosso idílio particular, porque percebemos que não só a realidade não é como no sonho, é ainda muito pior. Somos obrigados a entrar em contato de forma potente e inequívoca, com dores longínquas, antigas e esquecidas, que ressuscitam nossas vulnerabilidades mais resguardadas e defendidas. A dor maior de todas é a grande solidão existencial, como diz Clare Martin: “Quíron em Peixes descreve um tipo de ‘solidão existencial’, uma sensação de se estar alienado da fonte de suporte, um tipo de exílio emocional, do qual as pessoas passam muitos anos tentando se curar, através de relacionamentos. É como se Peixes mantivesse uma memória de unidade com o tudo que possa ser a memória da conexão mística ou a memória da vida no útero.” (1). Com a Lua sendo cheia conjunta a Quíron, essa solidão existencial vem nos assombrar e nos ferir feito navalha na carne. E a ironia é que em Peixes gostaríamos de escapar, mas Quíron vem dizer que não há escape, porque a ferida remete exatamente a isso: não há escape eficiente e duradouro o bastante que nos livre da desilusão, da alienação, da saudade da uroboros uterina, nem da raiva da mãe (e do pai/parceiro/irmão/amigo) que nos abandonou, da sensação de exílio que nos persegue aonde formos, e, em última instância do medo da dissolvição total no nada e no caos; o medo de que não haja nada do outro lado e de que a idéia do Todo e da Fonte Eterna de Vida seja somente uma falácia para nos fazer atravessar as agruras da vida conformados.
Quando não percebemos a origem de tal dor e alienação, buscamos a eliminação do isolamento entrando e saindo de relacionamentos, só para sair ainda mais vazios e magoados, porque o outro é apenas humano como nós, incapaz de aplacar a fome que nos acomete, de nos dar o que buscamos e de nos redimir completamente da ferida da separação humana. A oposição de Vênus a Netuno enfatiza essa tendência de buscarmos redenção no outro, sem nos preocuparmos em ver a pessoa real, jogando sobre ela nossas expectativas, nossas projeções e tornando-nos, nós mesmos um gancho perfeito no qual segurar as fantasias dele, já que com Vênus-Netuno e com a Lua em Peixes, temos a incrível capacidade de perceber, por osmose, o que outro quer que sejamos, e automaticamente nos tornamos exatamente essa imagem sedutora, que engana não só a ele, mas principalmente a nós mesmos.
Todavia, embora seja tentador afundar no desespero ou na auto-comiseração ou mesmo nos mecanismos escapistas, todo o resto do mapa demanda que nos movamos em outra direção: que sejamos minimamente racionais e encaremos a Verdade, de forma honesta, de cara limpa, lúcidos, (Mercúrio-Urano-Plutão) porque “a Verdade nos libertará”; que assumamos a responsabilidade por nossas dores individuais e percebamos que muitas delas são sociais e coletivas, ao invés de culpar o mundo e reclamar da nossa sorte achando-nos no direito de pisotear outros na nossa intransigência, insensibilidade e grosseria, achando que nosso sofrimento é maior que o do outro (Lua-Quíron/Júpiter-Saturno-Urano); que “superemos a noção de que temos que ser ‘normais’, porque ela nos rouba a chance de sermos extraordinários” (2) e, ao invés de tentarmos ser ‘normais, “apossemo-nos de nossa singularidade porque não há nada mais aprisionanante do que ser falso” (3) (Sol-Saturno-Urano).
O Grande Trígono em Água formado por Lua-Quíron, Juno em Câncer e Vesta e Saturno em Escorpião aparece em nosso socorro. Em Saturno encontramos uma certa ancoragem que impede que afundemos de vez; ancoragem que é ajudada por Vesta e os rituais diários, que nos colocam em contato com o centro; em Juno encontramos sustentação emocional daqueles que nos amam de verdade e que podem oferecer a necessária nutrição afetiva; e o Quíron que significa dor e feridas hediondas é o mesmo que nos permite ter sabedoria, a compaixão e a empatia que pode nos aproximar dos outros, ao invés de nos afastar. Um grande Trígono que pode propiciar o conforto e o lugar seguro para lambermos as feridas causadas pela já referida solidão existencial. E, se não nos rendermos à amargura e ao cinismo, “podemos finalmente vir a aceitar que, dado que estamos em corpos separados, esse tipo de solidão é uma parte intrínseca da condição humana, e, portanto, algo que todos nós sentimos em algum nível. Uma vez que tenhamos aceitado que o cordão umbilical foi cortado, nós podemos desenvolver compaixão por nós mesmos e pelos outros, já que, até certo ponto, todos sentimos essa ferida existencial.” (1)
Finalmente, trago a imagem dos Símbolos Sabianos da Lua Nova, que ocorreu no grau 2°18 de Virgem e o grau da Lua Cheia, que ocorre a 16°19 de Peixes. O Símbolo da Lua Nova tem a seguinte ilustração: “Dois anjos trazendo proteção”; o da Lua Cheia traz também uma imagem religiosa: “Uma procissão de páscoa”. Dois símbolos que trazem uma esperança e a admoestação de que por mais que temamos o vazio e o nada, é preciso confiar nos poderes superiores, que sabem mais, que falam de esferas e de coisas que não conseguimos alcançar com nossa limitada percepção humana. Mais, ao trazer a imagem de uma “procissão de páscoa”, evoca a Passagem da morte para a Ressurreição, e lembra que mesmo o Cristo, o Filho de Deus, submeteu-se aos sofrimentos humanos, vivendo a experiência humana, neste mesmo “vale de lágrimas” que habitamos, sentindo o mesmo peso do abandono, da solidão e da alienação, tanto no Getsemani, quanto na Via Dolorosa e na Cruz, tendo porém ressuscitado, redimindo assim toda separatividade, que é, em última análise, a separação do homem da sua fonte divina.
Qualquer que seja nosso credo, é preciso confiar que do desmembramento do sofrimento humano chegaremos um dia à ressurreição onde voltaremos a ser Um com o Todo Divino. E mesmo que não creiamos em nada, é preciso pelo menos buscar a aceitação de nós mesmos e nossas feiuras e feridas, tendo compaixão não só pelo outro, mas também por nós em nossa condição humana, porque “a coisa mais feia que há, é um ser humano sem compaixão” (4).
Que sua Lua Cheia seja de luz, compaixão e muita empatia!
(1) Clare Martin – Mapping the Psyche
(2) Uta Hagen
(3) Uta Hagen
(4) H.Milne
O TEXTO É ASSUSTADOR,VC É ENCANTADORA E A LUZ DA SUA FOTO É FANTÁSTICA!
Gratidão, Fernando!
Assustadores são nossos sentimentos e dores, às vezes, não é?
Que bom que você agora conhece o meu trabalho 😉
Grata pela visita. Volte sempre! :-0