Urano, o Despertador Cósmico
“Fazemos bem em lembrar que os planetas são, de fato, deuses, no sentido psicológico. Eles são energias vivas, com intenção e vontade, exatamente como uma pessoa, mas muito maior. Cada planeta tem uma natureza particular, um conjunto particular de necessidades e desejos e uma visão de mundo particular. Os planetas se movem em algum lugar; eles têm intenção e inteligência. Dentro de nós, eles representam aspectos da psique. Você não tem que ser pagão para apreciar essa perspectiva sobre os planetas. Eu uso o termo ‘deus’ como um símbolo de uma energia de vida, um padrão arquetípico funcionando em toda a vida. Porque os planetas estão fora, como também dentro de nós, e têm vida e uma identidade distinta, nós precisamos ter um senso do que essa identidade realmente é”.
Liz Greene, em The Art of Stealing Fire (1)
Sim, os planetas são energias vivas, têm uma vontade e uma intenção, particularmente dentro de nós. Qual é essa vontade e qual intenção, depende, além da natureza dos próprios planetas, dos posicionamentos em que se colocam no mapa natal. O ego precisa reconhecer esses deuses, essas energias psíquicas e mediá-las, dar-lhes expressão consciente, do contrário ficaremos à mercê delas. É mais fácil fazer isso quando se trata dos planetas pessoais, Mercúrio, Vênus e Marte, dos luminares, Sol e Lua e dos planetas sociais, Júpiter e Saturno. Os planetas exteriores representam forças coletivas, geralmente inconscientes para o indivíduo, mas ainda assim, precisamos reconhecê-los e criar espaço e tempo para que sejam expressos conscientemente.
A primeira intenção deste artigo era falar sobre o trânsito de Urano em Touro. Mas, não é possível falar de um trânsito, sem entendermos primeiro a natureza do planeta em questão, sua astronomia, mitologia e psicologia. E é essa a proposta aqui: ter um melhor entendimento da natureza de Urano, sua vontade, intenção e manifestação, na psique do indivíduo e do coletivo.
O artigo sobre Urano em Touro virá depois.
Urano – Astronomia
Urano é o planeta mais excêntrico do Sistema Solar. Desde a sua astronomia, até a maneira como foi nomeado, a forma como foi descoberto, tudo aponta para o simbolismo do planeta na astrologia: excentricidade, rebeldia, originalidade, inovação, progresso, desvios, diferenciação, liberdade, independência – entre muitas outras qualidades. Assim, para compreender melhor a dinâmica desse planeta, começamos pelos dados astronômicos. As fontes principais que baseiam este artigo são: The Art of Stealing Fire, de Liz Greene (1) e The Contemporary Astrologer’s Handbook, de Sue Tompkins (2).
Urano é o sétimo planeta a partir do Sol e o terceiro maior do Sistema Solar. Com um diâmetro de 52 mil quilômetros – mais de 14 vezes maior que a Terra – Urano está a 2,87 bilhões de quilômetros do Sol. A revolução completa ao redor do Sol, chamada de Período Sideral é de aproximadamente 84 anos, portanto, este planeta leva cerca de sete anos em cada signo zodiacal. Aqui preciso fazer um adendo: a Astrologia Tropical, praticada no Ocidente, NÃO utiliza as constelações, mas sim o Horóscopo Tropical, que é baseado no caminho aparente do Sol ao redor da Terra, e que também determina as estações – por isso o ano astrológico se inicia em março, quando o Sol ingressa em Áries, no Equinócio de Outono ou Primavera, dependendo do Hemisfério em questão – e é por isso também que na Astrologia Tropical NÃO existe um 13° signo chamado Orficus ou Serpentário!
O Zodíaco Tropical difere do Zodíaco Sideral por causa de um fenômeno chamado Precessão dos Equinócios, que é o movimento cíclico realizado pela Terra ao redor do plano de sua eclíptica. A precessão dos equinócios é um dos vários movimentos realizados pela Terra e corresponde ao deslocamento circular efetuado pelo planeta em torno do eixo de sua eclíptica, ou seja, tem-se a impressão de que os polos e o equador celeste movem-se em relação às estrelas. “A causa da precessão dos equinócios é o fato de a Terra apresentar uma certa inclinação em seu eixo de rotação, estimada em 23,5º. Por essa razão, o planeta realiza um movimento de cerca de 1º em torno do eixo vertical de sua esfera eclíptica a cada ano”[3]. Entenda melhor o que é a Precessão dos Equinócios. No passado, cerca de dois mil anos atrás, os horóscopos tropical e sideral “coincidiam”, mas devido à Precessão dos Equinócios, gradativamente eles foram se diferenciando, com o Zodíaco Sideral se movendo a cerca de um grau a cada 72 anos, para trás, de modo que atualmente o Zodíaco Tropical está a cerca de 23,5 graus à frente do Zodíaco Sideral, que utiliza constelações, então, quando o Sol ingressa em Áries por volta de 20/21 de março no Horóscopo Tropical, ele ainda está a aproximadamente 7 de Peixes no Horóscopo Sideral – este movimento também determina a transição da Era de Peixes para a Era de Aquário.
Voltemos a Urano! Este planeta foi descoberto em 13 de março de 1781, na cidade de Bath, Inglaterra, pelo músico e astrônomo amador William Herschel, acidentalmente – como é comum nos eventos simbolizados por Urano, que parecem “acidentais” – note que à época Herschel não era astrônomo profissional. Trafegava a 24 de Gêmeos. Já havia sido avistado antes, por John Flamsteed, que o avistou pelo menos seis vezes a partir de 1690 e o catalogou como 34 Tauri. Pierre Lemonnier, astrônomo francês também o observou por cerca de 12 vezes entre 1750 e 1769.
Mas, apesar de seus limites serem visíveis a olho nu, foi necessário o advento do telescópio para que fosse visto em plenitude e reconhecido como planeta – foi o primeiro planeta a ser descoberto através do uso do telescópio e sua descoberta expandiu as fronteiras do Sistema Solar pela primeira vez na história moderna. Sue Tompkins nos lembra que mesmo astronomicamente Urano sempre foi cheio de surpresas, o que já diz muito sobre a natureza do planeta: “astrologicamente, Urano tem a ver com várias formas de ser diferente, então, talvez não seja surpresa que o planeta também seja singular na sua astronomia”, afirma ela.
O planeta gira de forma excêntrica e única entre os planetas do sistema solar: seu eixo de rotação é inclinado para o lado, quase no plano de translação do planeta. Por causa disso, os polos norte e sul do planeta ficam praticamente onde estaria o equador no caso dos demais planetas, então ele parece com um pião girando de lado. Por causa dessa inclinação, o Sol brilha intensamente nos seus polos – ao contrário da Terra, por exemplo, onde o sol brilha mais fortemente sobre o equador. Assim como Netuno, é um planeta gasoso e é composto, basicamente de hidrogênio e hélio – ambos, Urano e Netuno são chamados de “gigantes gelados”. Seu campo magnético é poderoso e tem uma aparência azul turquesa devido a uma grande quantidade de metano na atmosfera que, em contato com a luz do Sol, causa esse brilho azul esverdeado. A cor turquesa é a cor do signo de Aquário, signo que é regido conjuntamente por Saturno e Urano.
O planeta tem um sistema de anéis, uma magnetosfera e pelo menos 27 luas, satélites naturais, a maioria delas nomeadas a partir de peças teatrais de Shakespeare. Essas luas foram descobertas em períodos diferentes e em 1986 a nave Voyager 2 descobriu mais dez luas escondidas dentro dos anéis de Urano. Novas luas são descobertas o tempo todo e isso faz parte das “surpresas” deste planeta. A Voyager 2 também observou que Urano irradia um tipo de arco elétrico, uma luz ultravioleta, que o torna ainda mais excêntrico e único.
Mitologia
Urano é um dos primeiros deuses a aparecer no panteão da mitologia grega, mas sua mitologia é bem escassa. De acordo com Hesíodo, em Teogonia, citado por Tompkins (2), no princípio, havia apenas o Caos, um vácuo vazio. A partir desse vazio, surgiram Gaia, a Mãe Terra e Urano, o Céu – Urano, em grego, significa “céu estrelado”. Tompkins diz: “observe que o céu é algo muito, muito distante e Urano está relacionado ao princípio psicológico do distanciamento”. Em outra versão do mito, Urano seria filho de Gaia, que surgiu sozinha do Caos, parindo Urano, o céu, posteriormente e ele então se tornou seu companheiro, um igual, vindo deitar-se sobre ela todas as noites. Eles se tornaram os avós dos Deuses Olímpicos. Juntos eles tiveram os Brontes (trovão), Estéropes (relâmpago) e Arges (raio), os Ciclopes, gigantes de um olho só. Urano e Gaia também tiveram os 12 Titãs – entre eles, o próprio Prometeu, que também é associado com a temática de Urano e de Aquário – e os Centímanos ou Hecatônquiros, que tinham cinquenta cabeças e, como o nome denuncia, cem mãos, cada um – por isso Urano se relaciona com todo o tipo de mutação e anomalia genética. Tompkins analisa que é provável que as mutações tenham ocorrido porque Urano era filho de Gaia, o que implica incesto e a ultrapassagem de um limite, algo que não era bem visto na civilizada sociedade grega. Mas isso é parte do arquétipo de Urano: cruzar e ultrapassar fronteiras e quebrar regras! Por isso mesmo Urano também é associado às pesquisas científicas, modificações genéticas, clonagem e todo o tipo de descoberta ou experimentação que envolva a Natureza. Frankenstein, de Mary Shelley, é um exemplo perfeito de criação/invenção Uraniana: na busca de melhoria de vida humana, no afã de vencer os limites da natureza mortal, o Dr. Frankenstein cria um verdadeiro monstro.
Contudo, Urano não gostou dos filhos que Gaia lhe deu, porque, a seus olhos, eles eram demasiado feios, imperfeitos, ctônicos, terrosos, como sua mãe, Gaia. Como Deus-Céu, Urano é extremamente idealista, a melhor e mais perfeita versão das coisas e a visão dos filhos de Gaia o desgostou profundamente. Assim, ele os aprisionou no Tártaro, um lugar nas profundezas da Terra. Em algumas versões do mito, o Tártaro é o próprio útero de Gaia e Urano teria empurrado os filhos de volta ao seu ventre. Obviamente, Gaia ficou profundamente ofendida com essa atitude de Urano, afinal, seus filhos se pareciam com ela e elas os amava. Então, ela encorajou os filhos a se rebelarem contra o pai. Mais que isso: fez uma foice imensa e pediu ajuda a Cronos (Saturno) e aos outros filhos, mas apenas Cronos concordou em ajudá-la. E foi assim que Cronos conspirou com a mãe contra o pai: munido da foice dada por sua mãe, esperou que Urano viesse se deitar sobre Gaia e, aproveitando seu cansaço após cobrir Gaia, Cronos pegou os testículos do pai com a mão esquerda e, com a foice na mão direita, o castrou, jogando seus testículos ao mar. Dessa forma, ele apossou-se do trono e se tornou o novo rei dos deuses.
Dos genitais atirados ao mar surgiu uma espuma (sêmen) e dessa espuma nasceu Afrodite, a Deusa do Amor, que nasceu – pasmem! – de um ato extremo de violência e da castração de Urano! Do sangue que caiu sobre a terra surgiram as três Fúrias, as Erínias, personificações da vingança, que puniam os mortais – Nêmesis, a Deusa da Vingança, punia apenas os deuses. As Erínias eram Tísifone (Castigo), Megera (Rancor) e Alecto (Inominável). Sua visão era aterradora: tinham asas de morcego e cabelos de serpentes. Liz Greene, coloca que “duas imagens extraordinárias do feminino surgem desse ato de castração, uma associada com beleza e harmonia, a outra com vingança”. Numa versão do mito, Cronos castra o pai enquanto ele ainda está em intercurso com Gaia, então, ele não separa Urano apenas de seus genitais, mas o separa também de Gaia, a Terra, simbolizando a separação arquetípica dos pais divinos, a interrupção do casamento entre céu e terra, a separação de espírito e matéria, que se tornam aparentemente irreconciliáveis, para sempre. Por isso a história de Urano está inextrincavelmente ligada à de seu filho Cronos/Saturno. Saturno representa a realidade terrena, que é muito diferente do ideal celestial.
Ao analisar a mitologia de Urano, Liz Greene [1] diz que é um deus bastante elusivo no mito, não tem uma personalidade como os outros deuses têm e assim, não é tão próximo das características e comportamentos humanos, dos quais os deuses são arquétipos. Os Deuses Olímpicos, a terceira geração de deuses gregos, têm forma antropomórfica, Urano, não. Mas ela lembra que ele é extraordinariamente fértil, “cobrindo” Gaia, a Terra, e concebendo uma nova criança todas as noites. A despeito dessa fertilidade abundante, ele acha seus filhos repulsivos, porque eles não são nem de perto o que ele tinha imaginado na sua mente idealista: não são bonitos, nem agradáveis, nem simétricos como um desenho geométrico, e como talvez ele esperava que fossem.
Greene também relaciona Urano com o Deus Javé, do Antigo Testamento, porque, quer tenha nascido junto com Gaia, ou sido parido por ela, “Urano tem muito em comum com o Deus do Gênesis, que coloca as estrelas no firmamento e cria o Sol, a Lua e cujo espírito paira sobre as águas. A morada de Urano é a mais alta e mais inacessível região dos céus estrelados, a ‘esfera cristalina’, na qual as estrelas fixas são colocadas como joias”. Greene lembra que não havia santuários para cultos a Urano no mundo antigo, “porque ele é o Tudo e o Primeiro e é impossível de ser encarado; ele precede a criação física e, portanto, não tem forma”. Se não tem forma, não é possível de ser visto, e ela diz que todos os potenciais da criação existem dentro de Urano, mas até que sejam manifestos, são apenas ‘ideias na mente de Deus’. “Elas são a forma Ideal de Platão, o diagrama no qual a Manifestação é baseada”, afirma.
Urano e a Astrologia
Urano tem ainda relação estreita com a matemática grega – que não era igual à matemática de hoje, de acordo com Greene. Os gregos tinham uma visão de que o Cosmos era interconectado e “a ciência grega via cada aspecto da vida como parte de um enorme sistema vivo”. Pitágoras tinha esse conceito de um cosmos unificado, uma imagem do Todo: “qualquer coisa que existe em manifestação começa com uma ideia abstrata e a mais pura forma dessa ideia abstrata é o número. Primeiro existe o Um, que pode ser expresso por um ponto e um círculo, que nunca começa nem acaba; do Um nasce o dois; o dois gera o três, e então surge a figura plana. O Número é a mais essencial qualidade do Universo”. A partir daí, Greene traça a associação que Urano tem com a Astrologia, embora ela esclareça que a prática em si, de ler e interpretar horóscopos não seja uraniana por si mesma, mas sim o estudo dos Horóscopos Harmônicos, que são uma versão moderna da visão cósmica de Pitágoras. “Deus, o cosmocrata, o arquiteto da manifestação, é mais vividamente incorporado na estrutura numérica e geométrica do universo e em nenhum lugar isso é melhor expresso do que na estrutura numérica e geométrica da astrologia”.
Urano na Astrologia
O planeta Urano foi nomeado primeiramente em homenagem ao Rei George III, da Inglaterra, pelo próprio descobridor, Herschel, que o chamou de George Sidus – Estrela de George. Contudo o nome não foi bem aceito fora do Reino Unido e outros astrônomos chegaram a sugerir que o planeta fosse batizado com o nome de Herschel. O nome Netuno também foi proposto, mas finalmente, um astrônomo alemão chamado Johann Elert Bode o nomeou Urano, usando a lógica da hierarquia: como Saturno era o pai de Júpiter, o novo planeta deveria ser nomeado em homenagem ao pai de Saturno, Urano. Em 1789 o colega de Bode, Martin Klaproth, nomeou o elemento químico que havia recém descoberto de urânio, em apoio à escolha de Bode. Entretanto o nome Urano só foi oficializado quando o HM Nautical Almanac Office trocou o nome George Sidus para Urano, em 1850. Outra excentricidade de Urano é que ele é o único planeta que foi nomeado em homenagem a um deus da mitologia grega, ao invés da mitologia romana, como é o caso dos outros. O grego Οὐρανός foi modificado para a forma latinizada Uranus.
Agora, como se explica que os planetas sejam nomeados com nomes de deuses, por astrônomos, que normalmente não levam em conta considerações astrológicas ou mitológicas e ocorre que eles acabam por incorporar exatamente todo o conjunto de símbolos e significados mitológicos? Não se tem resposta para isso, a não ser o conceito de sincronicidade e a ordem inexplicável e misteriosa do Universo. O fato é que Urano é Urano e incorpora toda a mitologia e simbologia do deus de quem herda o nome: o tema da castração e da cisão, o idealismo extremo e a rejeição do imperfeito (engole os filhos feios), o distanciamento emocional (está lá nos altos céus), revolta, revolução, rebeldia, liberdade (descoberto em período revolucionário na história humana), temas que vamos explorar agora.
Astrologicamente, Urano está relacionado com o advento de novas ideias, com a originalidade, a inovação, os avanços científicos e o progresso em geral. A maioria das grandes invenções caem sob a regência de Urano, exatamente porque significam avanços que mudam o mundo e as sociedades. Porém, muitos dos avanços podem significar quebras de regras, leis, fronteiras e o planeta também é sinônimo de rebeldia, revolta e revolução. Sua descoberta foi precursora de grandes mudanças sociais, econômicas e políticas no mundo todo. Quando Urano foi descoberto a Revolução Industrial, por exemplo, já estava em pleno curso e já tinha deixado milhares de trabalhadores desempregados e iniciado o processo de êxodo rural na Inglaterra! Os Estados Unidos tinham acabado de conquistar sua independência e a Revolução Francesa, que mudou os rumos da história política e econômica do mundo europeu e, consequentemente, ocidental, já cozinhava em fogo lento e estourou poucos anos após a descoberta deste planeta, tanto que os valores da revolução são associados a Urano e a Aquário: liberdade, igualdade, fraternidade.
Urano representa precisamente a rebeldia contra tudo aquilo que se tornou enrijecido ou engessado, sem vida, como foi o caso das cortes europeias no fim do século XVIII. É iconoclasta, não-convencional e anti-status quo. É progressista e, portanto, oposto à tradição e ao conservadorismo, representados por Saturno – Tompkins nos lembra que todos os planetas exteriores, de formas diferentes, desafiam as construções e estruturas de Saturno. Saturno, aliás, é o oposto psicológico dos luminares e de todos os demais planetas. “No caso de Urano, o desafio é à autoridade, tradição, ao status quo e ao próprio tempo. Urano tem a ver com liberação e liberdade, enquanto Saturno tem a ver com controle e segurança, dois conceitos que não ficam muito confortáveis lado a lado”, afirma ela.
O tema do forasteiro/outsider, dissidente/maverick, desviante também é um tema uraniano. Ao contrário de Saturno, com Urano não nos preocupamos em ser aceitos ou aprovados socialmente: há um tipo de repulsa às convenções e à “normalidade” e embora a dissidência signifique, muitas vezes, um grande isolamento social e intelectual, pessoas muito uranianas não se importam com os rótulos ou opiniões alheias. Seu caminho é um caminho único e original, diferente de todos os outros caminhos e escolhas. Neste caso, Urano tem uma similaridade com Quíron, que também é associado ao tema do outsider. A diferença é que com Quíron, nos sentimos outsiders de uma forma muito negativa: somos o bode-expiatório, nos sentimos profundamente inadequados, aleijões sociais e isso é uma grande ferida, que não sara. Já no caso de Urano, essa excentricidade é ostentada e possivelmente motivo de orgulho. Fazemos questão de ser diferentes e de não nos encaixar na norma; temos prazer em ser “do contra”, às vezes até de forma negativa e imatura. No fundo, ostentar essa diferenciação extrema pode ser um mecanismo de defesa que garante o não envolvimento pessoal ou emocional com pessoas e situações.
Essa diferenciação extrema pode ser também reflexo de uma identificação muito forte com o arquétipo do dissidente. Liz Greene faz um uma afirmação um tanto controversa e que vai contra uma ideia comum no meio astrológico: a de que Urano representa individualidade. Ela discorda veementemente porque, em primeiro lugar, Urano é um planeta coletivo e não pessoal; segundo, pessoas muito sintonizadas com Urano tendem a pensar e agir muito em função da ideia do “nós”, do grupo, do coletivo – não podemos esquecer que Urano é regente de Aquário, um signo associado com o grupo e oposto a Leão, este sim, o signo da individualidade. O Sol, aliás, está em detrimento em Aquário, exatamente porque Aquário não é sobre o indivíduo, mas sobre o grupo. Então, ela argumenta que pessoas que ressoam na energia uraniana vão ser dissidentes, excêntricas, outsiders, mas geralmente há pouca valores pessoais e identidade pessoal: “tal pessoa pode se rebelar contra estruturas ou atitudes existentes ou pode rejeitar uma visão de mundo que lhe pareça ultrapassada. Ele ou ela pode estar em contato com ideias muito progressivas e inspirações muito à frente do seu tempo. A pessoa uraniana pode ser altamente não convencional em função disso, mas não convencional não significa individual”. Particularmente, eu observo que quando Urano está muito destacado no mapa, em contato com planetas pessoais, a pessoa tem sim, esse senso de coletivo, de grupo e de valores mais universais e pode sim, haver dificuldade em lidar com a própria vida e situações mais íntimas da perspectiva unicamente individual. Pode ser muito difícil construir um senso de identidade, de ‘eu’, porque a identificação com os anseios do grupo e do coletivo pode ser mais forte, esse grupo podendo ser, em alguns casos, a própria família, ou qualquer coisa que dê a ideia de um “nós”. Tais pessoas podem parecer, de fato, egocêntricas, contudo, o que pode ocorrer é que as necessidades e desejos individuais provavelmente foram suprimidos e jogados para a sombra e, inadvertidamente, vemos o indivíduo agindo de forma muito egoísta e “individual” quando se distrai dessa identificação altamente idealista com os valores do grupo e do coletivo. Por pessoas “uranianas” entenda indivíduos que têm Urano conjunto aos ângulos: Ascendente e Descendente, meio do Céu e Fundo do Céu; e indivíduos que têm Urano em aspecto próximo aos luminares e planetas pessoais: Sol, Lua, Mercúrio, Vênus e Marte. E você, que tem Urano em grande destaque no seu mapa, qual a sua experiência?
Urano por signo
Sendo um planeta exterior, Urano se move de forma muito lenta, como já dito, levando cerca de sete anos para trafegar um signo zodiacal e 84 anos para percorrer o Zodíaco inteiro. Em função disso, sua posição por signo não diz muito sobre o indivíduo, mas sim sobre uma geração inteira nascida com este posicionamento, a não ser, é claro, que Urano esteja conjunto a um planeta pessoal no signo em questão. Por exemplo, Urano trafegou por Aquário de 1995 a 2003. Este foi um período em que tivemos avanços enormes nos campos da tecnologia e das ciências em geral. Foi o período em que os telefones celulares se tornaram populares e chegaram à pessoa comum e não apenas aos muito endinheirados; foi a partir desta época também, que a internet começou a ser o que é hoje para todos nós, tornando o mundo naquilo que se convencionou chamar de “aldeia global”, conectando pessoas e culturas distantes. As pessoas nascidas neste período já cresceram no mundo digital e já tendo grande familiaridade com todas as geringonças altamente tecnológicas que temos por garantido no mundo de hoje e que eram inimagináveis até 30 anos atrás.
Da mesma maneira, Aspectos entre os planetas exteriores são característicos de gerações e vão dizer mais sobre os indivíduos quando os interpretamos nas casas em que caem, mais do que nos signos ou pelo próprio aspecto em questão. Netuno ficou em sextil a Plutão, por exemplo, por várias décadas, então, não é algo que se possa individualizar. Urano tem estado em quadratura a Plutão desde 2008, considerando-se orbes amplas e, embora os aspectos exatos tenham ocorrido entre 2012 e 2015, esses planetas estiveram em quadratura até recentemente, então todas as pessoas nascidas entre 2008 e 2018 trazem no seu mapa a qualidade desses tempos extremos representados por esta quadratura.
Urano por casa no mapa natal
A posição de Urano no mapa natal diz mais sobre o indivíduo quando analisamos a casa em que Urano está. Nesta área de vida o indivíduo se sente muito diferente “do bando” e faz questão de ser, para o melhor ou para o pior. É onde entramos em conflito com autoridades, onde questionamos os valores tradicionais, onde sentimos que temos que trilhar um caminho inteiramente novo ou diferente. Por exemplo, Urano na casa 1 fala de uma pessoa que incorpora de forma muito pessoal o tema do outsider! São pessoas que têm alta necessidade de liberdade e independência pessoal e não se moldam a convenções de nenhum tipo. Se são muito inconscientes e insistem em levar uma vida comum ou tradicional, podem enfrentar muitos problemas até que reconheçam sua grande necessidade de mudança constante. Já na casa 2, a pessoa experimenta reviravoltas no campo dos valores e da segurança material; uma hora tem muito dinheiro, em outros períodos pode falir; seus valores podem mudar constantemente e o senso de segurança também. Na casa 3, a relação com irmãos é geralmente instável, as viagens domésticas estão sujeitas a imprevistos e a forma de aprender ou processar informações também não é linear nem tradicional – são as pessoas que aprendem com métodos diferentes e se forem obrigadas a se encaixar nos métodos tradicionais podem ser rotuladas como ‘problemáticas’. Na casa 4 a infância e a vida familiar podem ter sido turbulentas e cheias de altos e baixos; o pai pode ter sido ausente ou visto como muito imprevisível, frio e distante, genial, etc., dependendo dos demais aspectos do mapa; a pessoa também pode mudar de residência ou até de país algumas vezes na vida. Os romances, a diversão e a criatividade ficam sujeitos a muitas mudanças e guinadas radicais quando Urano está na casa 5, assim como a relação com os filhos – os filhos, aliás, podem ser vistos como restritivos à liberdade individual, podendo haver forte ambivalência quanto a este tema e, mesmo quando a pessoa tem filhos, irá cria-los de forma muito diferente dos outros pais e famílias. Na casa 6 o emprego precisa permitir muita liberdade e independência e a pessoa geralmente vai trabalhar com coisas pouco convencionais ou que envolvam atividades uranianas; a rotina é algo que precisa ser muito flexível e permitir mudanças diárias; a pessoa pode se sintonizar com dietas métodos de cuidados com o corpo muito alternativos ou experimentais. Na casa 7, as relações afetivas é que serão pouco convencionais e sujeitas a muita instabilidade; são as relações que são favorecidas pelos formatos diferentes: viver em casas separadas ou então um dos parceiros viaja muito, etc. – é necessário preservar o próprio espaço físico e emocional, do contrário, a relação fica ameaçada. A sexualidade é vivida de forma experimental e incomum quando Urano está na casa 8; pode haver valores nada tradicionais quanto aos bens compartilhados e a pessoa pode ganhar dinheiro dos outros de forma inesperada, dependendo do resto do mapa. Com Urano na casa nove, a diferenciação ocorre nas crenças e na forma de viver a espiritualidade, que vai ser muito diferente da espiritualidade da família ou do grupo social do indivíduo. Na casa 10, a profissão será inovadora, geralmente envolvendo tecnologia, sem obrigação de cumprir horários ou regras e é provável que a pessoa mude de profissão e de emprego algumas – ou muitas – vezes ao longo da vida! Na casa 11 os amigos são excêntricos, muito diferentes, talvez até estranhos; os sonhos e objetivos são também diferentes dos sonhos comuns e costumam estar alinhados com ideais coletivos. Finalmente, na casa 12, Urano sugere que o indivíduo tenha se sentido obrigado a ser convencional e a abafar sua originalidade, dessa forma, eles costumam parecer muito “normais” em público, revelando-se muito peculiares na vida privada, podendo mesmo discordar, inconscientemente, daquilo que vive em público; pode também estar alinhado com ancestrais que foram obrigados a abrir mão de uma vida criativa para atender às obrigações familiares e sociais.
E você, em que posição, por signo e casa Urano cai no seu mapa? O que isso diz sobre você, sua jornada e trajetória de vida? Como utilizar isso a seu favor e não contra você? Venha fazer uma consulta comigo e descubra isso e muito mais: psicologica.astrologia@gmail.com
Este é um resumo muito pobre e rápido do posicionamento de Urano nas casas, mas é apenas para se ter uma ideia. Qualquer que seja a casa, onde temos Urano é onde mudamos nossa concepção a respeito das coisas, várias e muitas vezes na vida; é onde temos que nos reinventar, descobrir, experimentar, ser diferentes da norma e das convenções; é onde somos originais, inovadores e inventivos; é onde questionamos e nos rebelamos contra as regras estabelecidas, desafiamos o “aceitável” e perguntamos por que não pode ser diferente. O insólito nos apraz e nos instiga e nossa forma de ser e agir naquela área de vida pode chocar as outras pessoas que, apesar de chocadas, podem se questionar a respeito de seus próprios valores, então também podemos ser catalizadores de mudanças. Se insistimos em ser iguais a todo mundo naquela área, certamente vamos ter problemas.
Urano em trânsito
Surpresas, eventos inesperados, ocorrências imprevisíveis são mais ou menos sinônimos entre si e são, definitivamente, a forma de “ação” de Urano, que vai nos chacoalhar e nos tirar da nossa tranquilidade, desestabilizar, inquietar, questionar, perturbar. Por isso mesmo ele também é chamado o Grande Despertador Cósmico, porque nos afronta, nos cutuca e questiona, como se dissesse: “ei, tem certeza de que a vida é só isso mesmo? Tem certeza de que você sabe quem realmente é? Você conhece mesmo a sua natureza mais profunda? ”. Então, ele nos vira do avesso e o nosso mundo fica de ponta-cabeça, geralmente de forma completamente inesperada, num piscar de olhos, abruptamente e nossa vida nunca mais será a mesma, nós nunca mais seremos os mesmos. Há uma percepção nítida da vida antes e depois de um trânsito/movimento de um planeta exterior a um planeta pessoal ou ângulo do mapa natal. No caso de Netuno e Plutão nós só vamos nos dar conta da enormidade da mudança e da transformação muito à frente, porque o processo é lento e demorado para se desdobrar. Já no caso de Urano, os acontecimentos “pipocam” diante de nós repentinamente e a paisagem é modificada para sempre. Por isso eu associo Urano ao raio e relâmpago, apesar de saber que tradicionalmente era Zeus/Júpiter o deus e planeta associado aos raios e trovões. Para mim um raio tem uma natureza e manifestação completamente uraniana: você nunca sabe onde, quando, como vai cair, mas uma vez que cai, altera completamente a paisagem. Ao mesmo tempo, um raio quando cai, traz um clarão fulgurante, que nos cega momentaneamente, mas que ilumina tudo de uma forma nova, com uma luz celestial, espectral, que nos faz ver as coisas como não as tínhamos percebido antes. Assim é com Urano, ele nos desperta e nos obriga a ver as coisas de perspectivas novas, sob nova luz; assim também são seus insights: chegam inesperadamente, como um raio!
Quando Urano toca um planeta/ângulo no mapa natal por trânsito, também somos imbuídos de uma nova vitalidade, como se recebêssemos uma descarga de mil volts! Há uma urgência e desejo de mudar, uma necessidade premente por liberdade e um anseio por quebrar amarras e impedimentos. Por um tempo a vida fica de pernas pro ar e as pessoas ao redor podem achar que enlouquecemos, dependendo do planeta que está sendo tocado, porque o que ocorre é uma verdadeira revolução na nossa vida. Pode ser perturbador, causar muita ansiedade, caos, mas o melhor que podemos fazer é colaborar com o processo, porque se resistirmos, a coisa toda pode ficar destrutiva e mais sofrida. Como diz Howard Sasportas, é melhor “colaborar com o inevitável” – será menos doloroso e mais criativo e nos dará mais possibilidade de chegarmos inteiros ao fim da jornada!
Você sabe onde Urano está trafegando atualmente no seu mapa natal e o que isso significa? Quais planetas está tocando? O que isso diZ sobre as mudanças que você precisa fazer na sua vida e na sua trajetória? Venha descobrir! Agende uma consulta: psicologica.astrologia@gmail.com
Este é um apanhado básico sobre Urano e seus temas. Obviamente não pretendi esgotar o tema e mesmo que escrevesse um livro, talvez ainda não fosse suficiente para esgotá-lo, porque os arquétipos e planetas são dinâmicos e estamos sempre descobrindo coisas novas sobre eles, especialmente Urano. Que possamos sempre colaborar com o inevitável representado por Urano e pelos demais Deuses da Mudança!
Outros temas/assuntos associados com Urano: eletricidade, choques elétricos ou emocionais; todos os tipos de explosões, interrupções, rupturas, quebras; no corpo quebra de ossos (geralmente Saturno também está envolvido), ruptura de vasos/veias, espasmos e cãibras, convulsões, todos os tipos de acidentes, geralmente com envolvimento de Marte e/ou Mercúrio; mutações, deformidades, membros biônicos, clonagem. Invenções e inovações, tecnologia, avanços científicos. O Iluminismo. Ambientes gelados, frieza. Extremismos, ideologias extremistas, ativismo político ou ambiental, causas ambientais. Relações a partir de segundos casamentos como enteados, madrasta, padrasto. Ostracismo, deportados e exilados, rejeitados sociais.
[1] GREENE, Liz – The Art of Stealing Fire: Uranus in the Horoscope – CPA Press, London, 1996.
[2] TOMPKINS, Sue – The Contemporary Astrologer’s Handbook – Flare Publications, London, 2006.
[3] UOL – https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/precessao-dos-equinocios.htm
(4) SASPORTAS, Howard – The Gods of Change – The Wessex Astrologer
Que belo artigo!
Muito obrigada, Isaac!
Seja muito bem vindo! 😀
Muito obrigada 🙂 <3
MUITO BOA A SUA FORMA DE EXPLICAR PRA GENTE,QUE EXISTE (POR EX.) UM SENTIMENTO COM OS PRÓPRIOS ASTROS,OBRIGANDO-NOS Á UMA NOVA PERCEPÇÃO DA ASTROLOGIA,DESTA FORMA COLOCANDO-OS CADA VEZ MAIS PRÓXIMOS DE UM ENTENDIMENTO POR ENQUANTO MUITO ESTUPENDO MAS QUE VAMOS INTUINDO SER NÓS MESMOS,(EU ACHO) .
Gratidão pelo comentário e feedback, Tatiana! Seja muito bem vinda! 😀
Muito bom seu artigo. Esclarecedor, bem escrito e fundamentado.
gratidão 😀