A Tempestade nos Sonhos

Temas Universais

Tempestade. Raios. Trovão. Chuva. Vento.

Um dia desses sonhei com uma tempestade se formando e achei que seria um bom tema para trazer aqui. O que eu não imaginei é que levaria tanto tempo para escrever, porque o tema se mostrou bastante complexo de pesquisar, dados os diversos elementos associados à tempestade, colocados acima. Mas, cá estamos nós, finalmente!

É um tema instigante. E antes de recorrermos às análises bibliográficas, vale pensarmos o que a imagem da uma tempestade evoca e como essa tempestade aparece no nosso sonho. No meu sonho, por exemplo, a tempestade estava se formando. Eu olhava para o horizonte e o céu estava muito escuro, nuvens densas e carregadas – nunca é demais ressaltar que é necessário capturar a sensação básica do sonho que mobiliza nossa emoção e sentimento.

A tempestade que eu via se formando trazia aquela sensação de algo iminente, de que essa tempestade ia cair e eu precisava me proteger. A sensação de que algo importante está prestes a acontecer. Eu estava no quintal de uma casa e olhava para aquele céu escuro e tinha uma sensação de urgência, de que eu precisava entrar logo em casa, recolher tudo o que estivesse fora, entrar e me proteger – qualquer semelhança com os trânsitos de Saturno-Urano não é mera coincidência hahaha!

William Keith – Domínio Público – Wikimedia Commons

No meu sonho, o temporal ainda estava se formando, mais ou menos como nesta imagem ao lado, mas às vezes você pode sonhar que está no meio de uma tempestade que já está acontecendo, caindo em cheio. A tempestade pode ser de chuva intensa, com relâmpagos, trovões e ventos furiosos; ou pode ser de neve, se você mora numa região sujeita a neve. A tormenta pode ser de granizo e até mesmo, de areia. Observe o contexto, o tipo de tempestade e em que fase da tempestade se passa o sonho.

Como tema, a tempestade pode ser olhada de várias formas. Primeiro, ela é um evento natural, uma manifestação da natureza. Pode ser um evento amedrontador, porque percebemos e sentimos a força da natureza de forma implacável. Há pessoas – especialmente crianças, mas não apenas – que ficam aterrorizadas com o som dos trovões ou com a visão dos raios cortando o céu. E há outras pessoas que se sentem eletrizadas e fascinadas com essas imagens. Mas, primordialmente, a tempestade nos fala de um evento natural, que geralmente interrompe o que quer que estejamos fazendo: cai a tempestade e se você se estiver fora, você vai procurar abrigo, vai buscar um ambiente interno, coberto, protegido.

A tempestade ou vendaval fala da natureza se expressando de maneira violenta, sentida como ameaçadora, extravasando seu aspecto destrutivo e, sendo uma expressão e manifestação da força da natureza, às vezes a tempestade pode ser uma metáfora, nos sonhos, para a nossa própria violência e agressividade e para o nosso lado mais instintivamente destrutivo; para sentimentos tumultuados e atormentados e nesse sentido ela pode, de fato, simbolizar estados mentais ou emocionais caóticos ou críticos quando aparece nos sonhos. Pode representar uma interrupção do curso atual de coisas ocorrendo na sua vida ou uma grande crise se formando ou se abatendo sobre você, especialmente se você está num lugar que não oferece uma proteção efetiva.

Como a natureza é criação e extensão do divino em muitas culturas, mitologias e religiões, sendo controlada por Deus ou pelos deuses, muitas vezes sua fúria expressada nos temporais e tempestades é vista pelo crente como repreensão e punição divina pelos pecados e desvios humanos. A tempestade pode ser assim “um símbolo teofânico manifestando a temível onipotência de Deus (…), uma manifestação da cólera divina e, às vezes, um castigo. Jeová desafia os homens a realizar ações como as suas, ao mesmo tempo em que afirma seu poder incomparável. A imagem da tempestade está no cerne de sua demonstração” (1). Ela é vista como intervenção divina, de modo geral colérica, mas às vezes também benéfica, podendo “evocar a glória e o poder divinos que abatem os inimigos do povo de Jeová e lhe asseguram a paz” (1).

Sim, há o lado positivo da tempestade: ela limpa o ar, libera aquela atmosfera estática e eletrizante que se formava; a chuva que cai rega e fertiliza o solo e geralmente percebemos, após uma chuva forte, como a natureza se regozija, como ela parece mais luxuriante, como tudo parece mais verde e refrescante. Então, a tempestade também pode trazer a sensação de limpeza e renovação, de frescor; de liberação de uma condição anterior, que estava sufocante, asfixiante. Uma mudança no clima, seja no sentido literal, seja no clima emocional.

Tormenta, Georgia O’Keeffe – Domínio Público – Wikimedia Commons

A tormenta pode significar muitas vezes o momento da ação criadora, dramática, terrível, mas ainda assim, criadora e fértil: “Os seres nascem do caos num indescritível transtorno cósmico. É na tormenta que aparecem os grandes começos e os grandes fins das épocas históricas: revoluções, novos regimes, tempo escatológico, Apocalipse” (1). A tempestade pode representar no sonho, um tempo liminal, divisor de águas entre um estado anterior e aquilo que se segue; um tempo crítico, em que tudo se convulsiona e se mistura, mas que libera grande poder criador e transformador, empurrando a vida para grandes mudanças. Os elementos da natureza (chuva, vento, raios e trovões) podem simbolizar as diversas partes do sonhador, suas emoções revoltas, mas ao mesmo tempo profundamente criativas e cheias de vida, energia e potência.

Nádia Julien lembra que na Índia, o temporal é o desencadeamento poderoso das forças criadoras. O fogo celeste, atributo e arma de Indra, deus védico da atmosfera, como de Vishnu, sob o nome de chacra (roda), é o símbolo do poder criador e destruidor divino, simbolizado pelo machado de dois gumes (2).

Na percepção popular, a tempestade geralmente tem conotações sombrias e negativas. No dicionário de sonhos de interpretações populares encontro o seguinte: “ver uma tempestade estando-se dentro de casa simboliza maquinações de inimigos; andar no meio de uma tempestade com raios e ventania, indica doença grave”. Essa é a interpretação popular para o tema da tempestade (3).

Pinheiro, num viés mais psicológico, diz que quando você sonha com uma tempestade, “isso pode indicar que você está enfrentando muitas dificuldades na sua vida. Os detalhes no sonho podem mostrar se você está abrigada do vendaval ou se a tormenta vai destrui-la. Se a tempestade já passou, você está salva, caso contrário a preocupação é grande (4).

De fato, na vida acordada, a tempestade pode representar muitas preocupações, dependendo de onde estamos e das condições em que vivemos. Se você vive numa casa segura e forte, vai aproveitar para tomar um chocolate quente, ler um livro, ver um filme ou simplesmente dormir, mas outros que não tenham a mesma sorte podem viver grandes dramas. Lembro de um hino de igreja de quando eu era criança:

“Para mim a chuva no telhado
É cantiga de ninar
Mas o pobre meu Irmão
Para ele a chuva fria
Vai entrando em seu barraco
E faz lama pelo chão”.

Não sei quem é o autor da composição – hoje em dia não dá para confiar muito na internet e geralmente encontramos várias referências de autores para a mesma composição, só sei que me toca bastante sempre que a ouço!

Por Bonaventura, I Peeters – Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=76759608

É essencial observarmos o contexto específico do sonho, capturarmos o sentimento básico do sonho, a sensação primeira que ele nos traz. Como é que nos sentimos nessa tempestade? Ela nos revigora e nos deixa empolgados? Estamos debaixo dela, estamos abrigados, estamos correndo para nos proteger? Ou essa tempestade se faz, de fato, assustadora?

Como a tempestade é composta de vários elementos, achei por bem trazer cada um deles em separado, de forma resumida, para ajudar a elucidar os sentidos do sonho. Além disso, nas minhas fontes usuais nem sempre encontrei o termo tempestade, mas apenas alguns desses elementos. São eles: trovão, raio, chuva e vento. Nota > Cada um desses termos mereceria um artigo inteiro para falarmos deles e alerto que os trago de forma bem resumida aqui, com a intenção de expandi-los no futuro, seja editando o presente artigo, seja separando-o em novos artigos.

Trovão

Wikimedia Commons

Apesar de não ter o termo tempestade no seu Léxico de Sonhos, Günter Harnisch traz vários outros termos associados à tempestade, entre eles, o Trovão, sobre o qual diz “essa imagem onírica indica ira, raiva e outros sentimentos agressivos. Tensões psíquicas e físicas que buscam por descarga. Essas emoções podem também já terem sido descarregadas” (5).

Na tradição bíblica, o trovão é a voz de Deus. “É também a anunciação de uma teofania” (1). Em várias culturas e mitologias, o trovão é associado com deuses ou com um deus em específico. Na mitologia grega Zeus é o deus dos raios e trovões e há várias passagens de mitos relatando mortais e semideuses sendo aniquilados por seus raios – como foi o caso de Asclépio. Os trovões também eram tidos como os estrondos e reviramentos das entranhas da terra na tradição grega. Na mitologia romana é Júpiter o deus dos raios e trovões.

No Popol-Vuh, livro sagrado dos maias, “o trovão é a palavra falada de Deus, enquanto o raio e o relâmpago constituem a palavra escrita de Deus no céu”.

Taranis era o deus das chuvas, trovões, tempestades e também da fertilidade na mitologia celta. Nesta cultura, trovão e raio eram entendidos como instrumentos divinos de castigo.

Julien menciona que no I Ching o trovão corresponde ao trigrama Tchen (o despertador), ao movimento, ao dragão, à veemência, à agitação, aos pés, ao tambor, ao retorno à vida, ao que é forte. Ele é o ruído do fogo e o riso do céu” (2).  

E é claro que não podemos esquecer de Thor, o Deus do Trovão na mitologia nórdica! Além do trovão, ele está associado aos “relâmpagos, tempestades, árvores de carvalho, força, proteção da humanidade e também à santificação, cura e fertilidade e a guerra” (6)

Raio

Wikimedia Commons

Para Harnisch, “o raio aparece em duas significações diferentes: enquanto o fenômeno violento da natureza pode ser sinal de repressão afetiva e recalque, que reagem através de um gesto repentino e agressivo. Nesse sentido, ele significa uma descarga incontrolada de tensões físicas ou psíquicas. Se o raio brilhar apenas e espalhar o seu clarão sem causar angústia ou provocar danos, pode simbolizar uma iluminação repentina” (5). Ele também associa o tema da tempestade com violência.

Mark Thurston interpreta o raio como “as foças superiores, que podem ser destrutivas para muitas pessoas, mas que são também fluxo doador de vida; medo; uma percepção súbita; vingança; uma repentina descarga de tensão; carma +imediato” (7).

Na Enciclopédia dos Pesadelos, Belanger e Dalley dizem que “Relâmpagos são pura energia elétrica e tão imprevisíveis quanto potencialmente destrutivos. Raios atemorizantes em pesadelos talvez sejam mais do que apenas uma ‘atmosfera’; podem ser manifestações de sua própria criatividade dançando à sua volta – poderes que ainda não foram libertados, mas que estão implorando para sê-lo” (8).  

Nádia Julien, no dicionário dos Símbolos diz que “nos sonhos, o raio e o trovão são imagens de eventos penosos e terríveis”, mas contraditoriamente, ela também fala, na mesma frase, que são “símbolos da intuição da revelação súbita e da impetuosidade (2).

Na mitologia celta, o raio simbolizava o “desregramento da ordem cósmica, manifestado pela cólera dos elementos. Os gauleses temiam que o céu lhes caísse sobre a cabeça e a promessa irlandesa apela ao céu, à terra e ao mar como as principais testemunhas. Há sim, uma noção de responsabilidade humana direta no desencadeamento do trovão e do raio. Entendido como um instrumento de castigo infligido aos culpados pelo Deus supremo” (1).

Entre os astecas, Tlaloc, deus das chuvas, da tempestade, do raio e do relâmpago mora no leste, lugar de renovação primaveril (1).

Também há muitas divindades femininas associadas às tempestades, raios e trovões, são divindades do ciclo lunar.

Chuva

Gustave Caillebotte – Domínio Público – Wikimedia Commons

Especificamente sobre a chuva, Harnisch diz que a chuva é um símbolo de fertilidade. Tem preponderantemente a significação de uma frutificação espiritual, no sentido de ideias novas e criativas. Às vezes, porém, esse símbolo pode expressar tristeza e sentimentos depressivos” (5).

Para Thurston, a chuva é sinônimo de “bênçãos e benefícios; situações que devem se manifestar num futuro próximo; emoções e extravasamento de sentimentos; tristeza ou mágoa; empecilhos; processos de purificação; término de um período de seca; necessidade de beber mais água” – aqui ele traz um significado bem literal (7).

Vento

Franz Stuck – Domínio Público – Wikimedia Commons

Sobre o vento, Harnisch diz que em muitos povos antigos o vento era considerado a respiração da Terra. Ele era tido como a ação de poderes superiores ou do espírito dos ventos. Por causa das suas constantes transformações, o vento é visto na linguagem dos sonhos também como símbolo de inconstância e volubilidade. Tanto na realidade como nos sonhos, o vento é um fenômeno natural. Se ele se erguer, algo de peculiar vai acontecer. Muitas vezes ele expressa energias espirituais muito fortes. Assim como o vento, também o espírito não é um material apreensível. Quando no sonho, ele se apresenta com uma mobilidade espiritual muito forte, indica a aproximação de uma tormenta. Também a calmaria do vento pode ser um símbolo de energia intensa. Às vezes, refere-se ao processo de esvaziamento interior experimentado, descrito como a plenitude da felicidade pelas pessoas das culturas orientais e atualmente, também pela meditação praticada no ocidente. O vento também pode servir como expressão de violência” (5).

Belanger e Dalley falam do vento como prenúncio de confusão emocional para o sonhador, geralmente sugerindo um desamparo que chega ao abjeto: “o vento indica que o sonhador está impotente em eventos que estão além do seu controle. Muitas pessoas que sofreram traumas (por exemplo, estupro ou acidente terrível) costumam sonhar com situações ameaçadoras, como ser pego num vento, tempestade, ondas gigantes ou tornado. Neste caso, o vento se torna o símbolo ou a metáfora que o sonhador escolheu para representar o evento ou os eventos precipitantes” (8). Aqui os autores incluem a tempestade como símbolo de ameaça ou perigo, diante da qual o sonhador se percebe impotente e à mercê dos elementos.

“Devido à agitação que o caracteriza, o vento é símbolo de vaidade, inconstância e instabilidade (…) É sinônimo do sopro e, por conseguinte, do Espírito, do influxo espiritual de origem celeste”, dizem Chevalier e Gheerbrant! (1).

Astrologicamente

Como a tempestade é símbolo de interrupção de algo, de alteração no que se está vivendo, imprevisibilidade e caos, a força feroz da natureza, podemos associá-la ao planeta Urano em trânsito no mapa astrológico ou mesmo o Urano natal sendo ativado por progressões e direções. Pessoalmente associo Urano à imagem do raio, pela sua imprevisibilidade e capacidade de iluminação e despertar – embora classicamente o raio seja um símbolo de Zeus-Júpiter. Dependendo da atmosfera da tempestade, talvez ela também possa ser associada a Plutão e se houver enchentes e transobradamentos, definitivamente tem Netuno em ativação também!

E você, alguma vez já sonho com tempestades ou temporais? Como foi o seu sonho? Você conseguiu associar ao momento que vivenciava? Conte aqui nos comentários! Se houver um tema que você gostaria de ver analisado por aqui, me conta também!

Fontes:

(1) CHEVALIER, Jean & GHEERBRANT, Alain – Dicionário de Símbolos – Rio de Janeiro: José Olympio, 1993 – 7ª Edição.

(2) JULIEN, Nadia – Dicionário dos Símbolos – São Paulo: Editora Rideel, 1993.

(3) SIRKENS e FISHER, Ernest B – Como interpretar os sonhos – Interpretações Populares e psicanalíticas. Rio de Janeiro. Ediouro, 1980.

(4) PINHEIRO, Carlos W – Interpretação dos Sonhos – Rio de Janeiro, K Editores, 2002.

(5) HARNISCH, Günter – Léxico dos Sonhos – Petrópolis: Ed. Vozes, 1999.

(6) Wikipedia – https://pt.wikipedia.org/wiki/Thor

(7)THURSTON, Mark – Sonhos – Resposta desta noite para as dúvidas de amanhã – São Paulo: Editora Pensamento, 1997.

(8)BELANGER, Jeff e DALLEY, Kirsten – Enciclopédia dos Pesadelos – A interpretação dos seus sonhos mais sombrios – Rio de Janeiro: Prestígio Editorial, 2007.

mariaeunicesousa

Maria Eunice Sousa é astróloga de orientação psicológica, formada pelo Centro de Astrologia Psicológica de Londres, fundado e dirigido por Liz Greene. Mora em Cuiabá, onde atende com Astrologia, trabalhando também como tradutora e intérprete (Inglês-Português). Além de Mapa Natal e Revolução Solar, também atende com Astrocartografia e Espaço Local (formada pelo Kepler College), Mapa Infantil, Mapa de Relacionamento e Mapa Vocacional.

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